Introdução:
Nem toda luz é arrogância. Nem toda escuridão é ignorância.
Este conto fala sobre coragem, humildade e o desafio de brilhar sem se perder do caminho interior. Mas também traz um alerta sutil — porque, às vezes, ao tentarmos justificar nossas sombras como “autenticidade”, corremos o risco de nos afastar ainda mais de quem realmente somos.
O Jardim dos Vagalumes
Era uma vez um jardim esquecido, onde poucos ousavam entrar.
Nele, pequenos vagalumes viviam escondidos na relva, acostumados à escuridão que reinava há tanto tempo.
Certa noite, uma jovem vagalume — cansada do peso do breu — decidiu que tentaria algo diferente: ela acendeu sua luz.
Não era uma luz constante.
Oscilava.
Fraca às vezes, intensa em outras.
Mas era sua.
E por ser verdadeira, mesmo trêmula, iluminava um pequeno espaço ao seu redor.
Alguns vagalumes observaram maravilhados.
Pensaram:
“Se ela consegue, talvez eu também possa tentar…”
E começaram, timidamente, a pulsar suas próprias luzes.
Mas nem todos reagiram assim.
Alguns, incomodados, cochicharam entre si:
— “Olhem só… metida a iluminada…”
— “Quer se mostrar, mas logo apaga, como todos os outros…”
— “Quem ela pensa que é?”
Esses, dominados pelo desconforto que a luz despertava em suas próprias feridas, tentavam apagar com palavras o que não conseguiam apagar dentro de si.
A jovem vagalume ouviu os murmúrios.
Por um instante, sentiu vergonha.
Pensou em apagar sua luz para não incomodar.
Pensou em voltar a ser como antes: invisível, segura no escuro.
Mas algo dentro dela — algo que não vinha do medo, e sim da verdade — sussurrou:
“Ser luz não é ser perfeita.
É apenas escolher, a cada dia, não se esconder de si mesma.”
Então ela sorriu.
E continuou a brilhar — ora forte, ora suave — sabendo que o que importava não era a perfeição da luz, mas a coragem de acendê-la.
E assim, sem querer provar nada para ninguém, ela iluminou o caminho para outros que, em silêncio, também desejavam encontrar a própria luz.
No jardim, algumas sementes começaram a brotar.
E novos vagalumes, tocados pelo brilho autêntico, começaram, pouco a pouco, a lembrar que também tinham uma luz dentro de si.
Moral do conto:
Não se apague para caber na sombra dos outros.
Seja luz, mesmo que sua luz oscile.
Ela é suficiente para transformar o mundo ao seu redor.
Mas atenção.
Esse conto não é um selo de validação para atitudes reativas travestidas de autenticidade.
Nem toda rebeldia é consciência.
Nem toda emoção jogada no outro é expressão legítima do ser.
Muitos confundem luz com arrogância — e criticam quem tenta caminhar com mais consciência.
Outros confundem impulsividade com liberdade — e usam o “eu sou assim mesmo” como escudo para não se transformarem.
Ser vagalume não é brilhar para provar nada.
É brilhar porque a luz é sua natureza, mesmo que ainda oscile.
Mas também é ter humildade de reconhecer:
Quando estou atacando, talvez eu esteja apenas me defendendo de uma dor que ainda não quero ver.
“Este conto não é sobre mostrar quem brilha mais.
É um convite à auto-observação silenciosa:
Você está acendendo sua luz com verdade?
Ou apagando a dos outros para não se sentir tão incomodado com o próprio escuro?”
Quando a pessoa ainda não tem um grau mínimo de autoobservação, ela pode até ler esse conto e pensar:
“Ah, eu sou esse vagalume autêntico, que brilha do meu jeito, e quem não gostar, paciência…”
— sem perceber que está, na verdade, usando a ideia de autenticidade para justificar atitudes reativas e destrutivas.
E é por isso que a profundidade da mensagem não está apenas nas palavras — mas em quem lê com presença.
Desire Lahe
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