"As Sete Faces da Dor"
1. A Caverna da Complacência
Havia um homem chamado Lázaro que vivia em uma caverna escura. Lá dentro, cada sombra projetada nas paredes era uma lembrança dolorosa, e ele as olhava com certo prazer sombrio. “É assim que o mundo é”, murmurava para si, enrolado em suas próprias correntes. Quando alguém lhe oferecia luz, ele virava o rosto. Era mais fácil acreditar que a dor era inevitável do que arriscar-se a mudar. O comodismo era seu cobertor e a ignorância, seu lar.
2. O Templo da Espera
Na cidade vizinha, vivia Clara. Ela sofria, mas tinha fé. Visitava templos, acendia velas e fazia promessas, aguardando que um milagre descesse do céu para curá-la. Carregava suas dores como relíquias sagradas, acreditando que um dia alguém — um santo, um mestre, um amor — viria salvá-la. Ela sabia que existia outro caminho, mas achava que não era digna ou capaz de trilhá-lo sozinha.
3. A Encruzilhada da Consciência
Então havia Noa, uma jovem que, ao tropeçar num espelho antigo em meio à floresta, viu refletido não apenas seu rosto, mas suas feridas. Sentiu medo, mas não fugiu. “Quem é essa dor?”, perguntou. E pela primeira vez, escutou sua alma responder. Noa não queria mais culpar o mundo. Começou a escrever cartas para si mesma, a meditar à beira do rio e a ouvir o silêncio. A dor já não era só um algoz; era um enigma esperando ser decifrado.
4. O Mestre Ferido
Com o tempo, Noa conheceu Elias, um velho andarilho que sorria com os olhos. Ele lhe contou que também fora ferido, mas que aprendera a caminhar com a dor como companheira, não como inimiga. “Toda ferida é um mapa”, disse ele, “e cada lágrima, uma bússola”. Juntos, conversavam com as cicatrizes e dançavam com os medos, até que Noa percebeu que aquilo que mais doía agora a guiava com firmeza.
5. A Ponte da Aceitação
Quando Elias se foi, deixando apenas seu bastão e uma carta de despedida, Noa sentiu-se só. Mas ao ler: "Aceitar não é se render, é se libertar", algo nela floresceu. Sentou-se ao pé de uma figueira e chorou — não de dor, mas de compreensão. A vida não era uma guerra a ser vencida, e sim um jardim a ser cultivado. A dor se assentou ao lado dela, em silêncio. Já não precisava gritar.
6. A Casa Transformada
Noa voltou à aldeia de Clara e Lázaro. Mas agora, ela trazia outro brilho no olhar. Suas mãos curavam sem tocar, suas palavras acolhiam sem julgar. “O que aconteceu com você?”, perguntavam. Ela sorria e respondia: “Eu aceitei minha dor. Ela me mostrou a saída.” Clara largou sua espera. Lázaro saiu da caverna. E a casa de Noa virou abrigo para todos que desejavam reencontrar a si mesmos.
7. O Voo do Espírito Livre
Num dia claro, Noa caminhou sozinha até a montanha. Lá em cima, estendeu os braços e sentiu a leveza de quem nada mais arrasta. O medo? Quebrado. A dúvida? Dissolvida. A mágoa? Transcendida. E ao tocar o céu com o coração aberto, ela compreendeu: toda dor, no fundo, é um convite. Não para nos ferir — mas para nos libertar.
Desire Lahe
"O Espelho em Névoa"
Havia uma jovem chamada Elira que carregava uma pedra no peito. Sabia que ela estava ali — pesada, incômoda, silenciosa — mas não sabia como havia parado lá.
Elira andava pela aldeia e às vezes, ao ver alguém gritar, sentia a pedra pulsar. Outras vezes, bastava um olhar atravessado para a pedra latejar. Ela sabia que aquilo tudo ecoava algo nela... mas o quê?
“Será que sou igual àqueles que me ferem?” — pensava. “Ou será que apenas reconheço neles o que um dia me faltou?”
Cansada de andar em círculos, foi visitar a Anciã do Bosque, que lhe disse:
— Às vezes, o que te dói no outro não é algo que você também é, mas algo que você não pôde ser. Outras vezes, é uma saudade do que você perdeu. E em muitos casos, é uma dor que você não sabia que tinha até o outro tocá-la sem querer.
— Como encontrar a origem, então? — perguntou Elira.
— Não tente com pressa. Deixe a névoa se dissipar. Quando o coração estiver calmo, o espelho mostrará não o outro... mas a si mesma.
E foi assim que Elira entendeu: não era sobre correr atrás da dor, mas deixá-la contar sua história no tempo certo.
Desire Lahe
Reflexão:
Há muitas formas de lidar com a dor.
Tem os que preferem se deixar levar pelo sofrimento, pois é mais fácil (e cômodo) acreditar que a vida ou as pessoas são assim, do que buscar formas de enxergar além dos limites auto impostos pelo pequeno ego. Essa ainda é a situação da maior parte da humanidade, presa na mais pura ignorância.
Também àqueles que até tem uma certa noção de que poderiam fazer algo para lidar melhor com suas dores, mas preferem arrastá-las consigo, já que acreditam que a “cura” virá de fora, como um milagre mesmo. Nessa categoria estão incluídos especialmente os religiosos.
Subindo alguns degraus temos as pessoas que começam a se questionar e a analisar suas dores, que já conseguem escutar um pouco mais os anseios da alma. Elas não olham mais para a dor só como um vilão ou inimigo, mas sim como algo que pode lhes trazer alguma luz interior.
Quando essas pessoas não desistem de analisar suas dores, elas começam a aprender com aquilo que mais doía e uma verdadeira virada de chave acontece em suas vidas, pois o que antes era pura sofrimento, se torna um verdadeiro Guia!
Com o aprendizado e com as mudanças que inevitavelmente começam a surgir, vem a tão necessária aceitação nesse processo. Porque sem ela é impossível avançar e desbravar o imenso mar da vida.
Parêntese: aceitar a dor não significa se acovardar e nem se subjugar a ela, pelo contrário. É fazer dela sua maior e mais valiosa aliada nessa jornada espiritual-terrena. E na medida em que a aceitação é verdadeiramente introjetada no dia-a-dia do indivíduo, a TRANSFORMAÇÃO chega de forma definitiva e nada mais será como antes.
A partir desse momento, tudo faz sentido e tem um propósito muito definido, desde sempre. Nesse instante divino, os grilhões do medo, da dúvida, do sofrimento, da mágoa, da raiva, da dependência e de tudo que é negativo que essa pessoa arrastava se quebram DEFINITIVAMENTE!
Porque esse é o único objetivo de toda e qualquer dor. Chega de se vitimizar. Chega de se culpar. Chega de se paralisar. Chega de se boicotar. (Guilherme Fernandes)
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