André tinha 38 anos e trabalhava como gerente de produto em uma empresa de tecnologia. Era respeitado, admirado e temido por sua eficiência. Sabia se posicionar, antecipar riscos e manter sua equipe sob controle. Nunca chorava. Nunca pedia ajuda.
Desde cedo, aprendeu que mostrar fragilidade era perigoso. Cresceu ouvindo que “homem tem que ser forte”, “quem vacila, perde”. E assim, com o tempo, moldou uma armadura — feita de inteligência, sarcasmo, e uma certa indiferença elegante. Essa era a fortaleza do seu ego. Ele a chamava de “meu jeito”.
Mas algo estava ruindo por dentro. André acordava exausto, mesmo dormindo bem. Sentia um nó no peito que não sabia nomear. Vivia se irritando com colegas por coisas pequenas. E, secretamente, sentia um vazio inexplicável. Tinha tudo — casa, carro, reconhecimento. Mas algo nele gritava.
Um dia, sua filha de 5 anos caiu da bicicleta. Chorava, assustada. Ele correu até ela e disse:
— "Não foi nada! Levanta! Você é forte, como o papai."
Mas, nos olhos da menina, viu a mesma solidão que carregava por dentro. Ela não queria ser forte. Ela queria ser acolhida.
Naquela noite, pela primeira vez, André chorou sozinho no carro. Um choro antigo, contido há anos. Não era sobre a queda da filha. Era sobre todas as vezes que ele mesmo caiu — e se obrigou a levantar sem ajuda, fingindo que "não foi nada".
Na semana seguinte, começou terapia. No começo, tentava convencer a psicóloga de que estava tudo sob controle. Mas aos poucos, as fissuras foram se abrindo.
Descobriu que seu perfeccionismo não era virtude — era defesa. Que sua impaciência vinha do medo de não ser suficiente. Que sua ironia era uma muralha contra a dor de não se sentir amado, apenas útil.
E então veio a frase que ele ouviu num podcast espiritual, quase por acaso:
“O ego é o guardião da individualidade, mas não é o senhor da sua alma.”
Naquele dia, algo cedeu. André começou a perceber que sua armadura era útil… mas estava velha. Ela o protegeu, sim. Mas agora o sufocava.
Ele não precisava eliminá-la. Só precisava deixar de ser comandado por ela.
E aos poucos, algo mudou. Pediu desculpas a um colega que havia humilhado meses antes. Deu um abraço silencioso em sua filha quando ela chorou de novo.
Parou de tentar vencer a vida — e começou a escutá-la.
André ainda era André. Mas pela primeira vez, sentia-se inteiro sem estar invencível.
🌿 Reflexão final:
Enquanto o ego proteger a individualidade sem reconhecer a alma, viveremos armados — e sozinhos.
A dor é o chamado da alma, sussurrando:
"Existe um outro jeito de viver. Você não está aqui para se defender. Você está aqui para se expressar em verdade."
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